MENU

Blog.

19 . 04 . 2019

Caso Clínico - Fadiga e “Hipoglicémia”

Reporta-se o caso clínico de uma paciente do sexo feminino, C.M., com 45 anos de idade, cujas principais queixas eram um cansaço crónico incapacitante e episódios de fraqueza exacerbada que haviam sido interpretados como possíveis hipoglicémias.  A situação foi revertida com recurso a ajustes na alimentação e suplementação.

Os sintomas tinham-se agudizado desde há um ano, coincidindo com uma  fase de trabalho intenso com muitas viagens, mas C.M. já havia tido um quadro semelhante em 2003. Na altura até tinha sido estudada em regime de internamento para despiste de hipoglicémia e identificação de eventual insulinoma (tumor produtor de insulina que pode causar quedas abruptas da glicémia). Esse internamento foi inconclusivo.

Os principais sintomas de C.M. eram:

  • fadiga e fraqueza, particularmente quando estava mais de 2-3 horas sem comer;
  •  tonturas;
  • irritabilidade;
  • insónia terminal;
  • dores de cabeça vespertinas;
  • pouca resistência ao stress.

Esta sintomatologia era típica de uma desregulação da glicémia e sugeria ainda um desequilíbrio a nível do funcionamento do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal. As glândulas supra-renais são responsáveis pela produção de cortisol, em resposta a estímulos do eixo hipotálamo-hipófise, localizado na base do cérebro e que funciona como o grande maestro do equilíbrio hormonal no corpo.

Na primeira consulta, foi analisada a dieta da paciente, tendo-se verificado ser bastante rica em hidratos de carbono refinados (pão, bolachas, bolos, etc.). Efectivamente, C.M recorria a estes alimentos como fonte de energia rápida para tentar evitar que o cansaço se agravasse. Contudo, estes hidratos de carbono acelulares (provenientes de açúcares e farinhas) têm um efeito contraproducente, pois geram uma curva de glicémia muito errática, com frequentes picos e vales, particularmente quando não são ingeridos com gordura ou proteína. Foi recomendada uma dieta sem cereais, com fruta e tubérculos como principais fontes de hidratos de carbono, e incentivado o consumo de proteína ao pequeno-almoço, devido ao efeito estabilizador da glicémia.
Passados dois meses, C.M. reportou uma melhoria sintomática de 80%, apenas decorrente do ajuste da dieta, que implementou com disciplina.
As análises de sangue revelaram uma deficiência de ferro, sem evidência de anemia, e valores insuficientes de vitamina D.

Fig. 1 – Achados relevantes na avaliação laboratorial após a consulta inicial.

 

Por sua vez, o teste hormonal revelou níveis de cortisol insuficientes. O cortisol é uma hormona fundamental, tendo funções como a supressão da inflamação, manutenção da pressão arterial e prevenção de hipoglicémia. Em situações extremas, as supra-renais não produzem qualquer cortisol apesar do estímulo do eixo hipotálamo-hipófise, sendo feito o diagnóstico de doença de Addison, cujos sintomas principais são astenia (cansaço) profunda, hipotensão e perda de peso. Este não era o caso de C.M., mas a produção total de cortisol encontrava-se diminuída.

Fig. 2 – Teste hormonal com doseamento de cortisol livre e metabolizado.

 

Nesta fase, foi recomendada suplementação com extractos glandulares e adaptogénios, que têm um efeito modulador na produção de cortisol. As deficiências de ferro e vitamina D foram, também, corrigidas. Continuou a haver melhoria sintomática, mas numa fase posterior, decidiu-se suportar a produção de androgénios (hormonas sexuais masculinas, que também existem na mulher), com uma dose baixa de DHEA (dehidroepiandrosterona), para corrigir os níveis deficientes de testosterona.

Apesar de não ter havido acção directa sobre as hormonas sexuais femininas,  uma vez equilibrado o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, os valores destas também normalizaram, traduzindo a interdependência destes sistemas hormonais.

Fig. 3 – Avaliação laboratorial após a 3ª consulta.

 

Este é um caso de desregulação hormonal induzida, em grande parte, por uma dieta rica em hidratos de carbono acelulares que conduz a disglicémia. O stress profissional a que C.M estava sujeita também terá contribuído para o agudizar da situação, pois sobrecarregou um sistema que já estava enfraquecido. Através de um plano integrado, que incluiu suplementação dirigida, foi possível controlar este processo e devolver qualidade de vida a esta paciente.

04 Comments

Muito boa partilha Daniel!

Obrigado Carina!

Ando sempre super cansada e cheia de sono. As pessoas dizem que é devido à medicação: Effexor 75 ao p.a. e ao jantar e Unisedil 5 (metade) ao p.a. e jantar. Será? Não viajo porque me sinto excessivamente cansada e necessito dormir muito. Poderá ajudar-me? Muito obrigada. Cumprimentos.

De facto essas medicações podem ter um efeito sedativo. Contudo presumo que necessite delas por algum motivo e não recomendo que as suspenda sem supervisão médica e conhecimento de quem as prescreveu. Tenho de conhecer o seu caso em maior detalhe para saber como posso ajudar. Recomendo que marque consulta para que possamos analisar melhor a sua situação.

DEIXE UMA RESPOSTA